"Um Barco atracado ao cais é sempre um sonho preso"

sábado, outubro 20, 2012

Entrevista ao Diário do Alentejo Nº 1591 de 19 de Outubro de 2012



                                                         Fotografia de Maria Clara Amaro

Novo livro de Luís Maçarico apresentado em Entradas
O regresso do poeta do silêncio

É um poeta ligado à terra, às pessoas, à memória das pessoas, às sensações e aos sentidos.
Luís Filipe Maçarico lançou ontem no Museu da Ruralidade, em Entradas, o seu décimo quarto livro de poesias: Transumância das pequenas coisas. São 23 poemas onde o poeta, que completa 60 anos a 29 de outubro, tece uma profunda reflexão sobre a “caminhada da vida”. Uma vida sempre ligada à sua terra natal, o Alentejo, sempre ligada às gentes da sua terra, à sua história, à sua cultura, à sua maneira de ver o mundo. À sua mundividência e à sua fraterna e contemplativa espiritualidade.

Luís Filipe Maçarico
60 anos, natural de Évora

Poeta e ensaísta, Luís Filipe Maçarico fez publicar 14 livros de poesia desde 1991, altura em que deu à estampa Da água e do vento. É técnico superior na Câmara de Lisboa e dedica boa parte do seu tempo livre ao associativismo. É mestre em antropologia e história. Publicou sete livros nestas áreas do conhecimento, entre os quais Aldrabas e batentes de porta – Uma reflexão sobre o património impercetível.

Que transumâncias são estas que agora convergiram neste livro?

É o insistente percurso, rumo a horizontes de liberdade. É a vontade de viver, onde haja indícios de harmonia. É a busca da respiração, à escala humana, num território onde seja possível concretizar sonhos. É a tentativa de aperfeiçoamento, nesta curta passagem. Que se faz com ideais, palavras, mas também com afetos e luta, por uma existência equilibrada e feliz. Este verão, não fiquei um único fim de semana em casa. De Monchique a Évora, de Montejunto a Viana do Castelo e de Odeceixe à Gardunha, a poesia seguiu sempre comigo, pastoreando gestos, emoções, e o espírito dos lugares.

O Luís Filipe Maçarico é um poeta da terra e dos sentidos. É correto afirmar que o Alentejo, a cultura telúrica alentejana, espreita sempre por detrás da sua poesia?
O silêncio é um dos meus alicerces. Desde miúdo que estar só não me desestabiliza. Os desmedidos horizontes são mais inspiradores. Por isso, o sol, o pão, o vinho, o cante, o prazer de uma sombra ou de uma amizade, todas as palavras terrosas e a poesia do Manuel da Fonseca me são vitais. O Alentejo faz parte do ADN do meu imaginário. Évora, urbe à qual regresso, frequentemente e é rumor de vozes, com refrigérios para a alma; Beja, percorrida vezes sem conta, para ver florir o sorriso dos amigos; Mértola, terra amada, com aquele Festival único, permitindo viver dias poéticos, entre a multidão, foi a última universidade: por lá concluí o melhor curso, frequentado em fruição absoluta, com colegas, professores e população, inesquecíveis; Santana de Cambas, na raia dos contrabandistas contribuindo para preservar a memória daquelas práticas numa investigação em livro, que proporcionou um Museu; Castro Verde, campo fecundo para a Poesia, graças ao presidente Francisco Duarte, ao vereador Paulo Nascimento e ao amigo-poeta Miguel Rego, que fizeram com que as asas do sonho, não ficassem na gaveta das utopias. Felizmente, são inúmeros os sítios, onde vivi e a poesia irrompeu. Creio que haverá muito pouco terreno, entre a serra de S.Mamede e os confins de Almodôvar e Ourique, onde não fiz um verso.

Para além de poeta também é ensaísta na área da antropologia e da história. Que futuro, que esperança, consegue descortinar para o homem que habita este território histórico e cultural que é o Alentejo?

Se houver sabedoria, para manter o equilíbrio entre a terra, as gentes e os bichos, se o património identitário marcar uma forte presença no quotidiano, o Alentejo poderá ser um bom lugar para viver. Assim, os alentejanos saibam criar riqueza, unindo esforços para não deixar morrer o sonho.

Conforme revela a autora do prefácio a este livro, a professora Maria Antonieta Garcia, o Luís Maçarico é um poeta que “sonha fraternizar o mundo”. Acha mesmo que ainda sobra espaço para a fraternidade no mundo em que vivemos?

Nunca, como hoje a partilha foi tão premente, – entre amigos, nas coletividades,nas autarquias, nas ruas, contrariando os déspotas, que tudo inventam para nos desumanizar, para nos fazer acreditar que o umbigo é quem mais ordena! Paulo Barriga

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